sexta-feira, 17 de abril de 2009

Memórias

Tenho saudades de quando tudo era simples. Éramos apenas miúdos inocentes que viviam cada dia com paixão. Sinto a falta de quando me olhavas com o teu olhar comprometido e coravas quando passavas por mim. Tenho saudades de te dizer que gostava de ti em tom de desafio, à espera de ouvir o mesmo da tua parte; saudades de sentir um nervoso inexplicável quando ía ter contigo; saudades de me rir sem razão, rir apenas por estar feliz na tua companhia; saudades de te contar os meus problemas e saudades de te fitar e pensar que o poderia fazer para o resto da minha vida.

Porque é que tudo o que nos faz felizes acaba tão repentinamente? Quando me beijavas e dizias que me amavas parecia tudo tão verdadeiro e inalienável. Tão real que, pensava, nada nos ía separar. Na altura ignorava tudo. O mundo era perfeito para mim, pois bastava a tua presença para ele ser integralmente perfeito. Não existiam pessoas desagradáveis, nem problemas de maior importância. Tu ofuscavas tudo isso.

Mas a inocência passa rapidamente quando nos deparamos com o que verdadeiramente nos rodeia. De repente tudo se desmorona. As pessoas em quem confiávamos desiludem-nos, os amigos que nos faziam rir magoam-nos e evaporam-se como água quando precisamos deles.

A vida assemelha-se a uma árvore. Na primavera enche-se de cor e de alegria. Geram-se frutos maravilhosos que a tornam fantástica e bela. No entanto, quando chega o Inverno, a árvore despe-se. Os frutos caem, as folhas esvoaçam serenamente até caírem no chão. A chuva começa a notar-se e a árvore ali fica, sozinha, abandonada, sem cor e sem vida.

No entanto, para as árvores existe sempre uma nova Primavera em que tudo volta a ser perfeito novamente. Mas, para nós, será que existe uma nova Primavera? Será que conseguimos ser felizes novamente? Eu penso que sim. Ou melhor, tenho que pensar que sim, se não que valor teria a vida? Mas acredita que nunca nenhuma Primavera foi tão deslumbrante como a nossa. Queria esquecer-me, mas as memórias também fazem parte de nós. Ainda te poderia dizer que gosto de ti, mas nada ia ser igual outra vez. Tenho receio de falar contigo agora. Prefiro guardar a memória da tua inocência do que estragá-la se te conhecer sem ela.

O tempo passou, o sentimento permanece…Guardo apenas a folha que caiu da árvore apressadamente naquela tarde de Outono…

( * )


"Nunca escrevi sobre ti nem sobre mim; de ti, porque não sei quem és e de mim porque me conheço bem demais para o fazer.
Sei tanto de mim como do resto... sei tanto de mim como um músico sabe de escalas, sei tanto de mim como um matemático sabe de contas e como um apaixonado sabe de sonhos.
Porque não falo de mim? Porque se o fizer tornar-me-ei vulnerável ao mundo, ficarei à mercê de quem não conheço e irei trair todo o conhecimento que aprofundei sobre mim mesma.

Mas porque não correr um risco? Porque não fazer por uma vez o que não faço nunca?
Nunca escrevo na 1ª pessoa porque... tenho medo que as pessoas me conheçam melhor do que eu quero mostar.
Nunca arrisco muito a tomada de decisões porque... tenho medo de errar e fazer a escolha menos correcta.
Não realizo e passo muito tempo a sonhar porque... os sonhos têm finais que eu comando e são sempre finais felizes.
Nunca admito que amo quando sei que o sinto porque... não me considero dotada o suficiente para ouvir um "eu também!".

Sim, sou perfeccionista, sonhadora e insegura.
Nao gosto que as coisas que planeei falhem e me fujam da alçada; sonho com tudo o que realmente quero mas não realizo porque tenho medo de não ser perfeita, ou melhor, porque tenho medo de não ser nem fazer tudo o que já idealizei; a opinião dos outros é penosamente importante para mim e recorro facilmente à aprovação de várias pessoas pois não sei até que ponto a minha estará correcta.

Dizem que sou sensata, que sou inteligente, que sei ser e estar, que sei encarar as oportunidades... Mas não me conhecem e a culpa não é deles.
Sou sensata com os outros mas não sigo aquilo que aconselho; sou inteligente mas não percebo de física nem de química ou desenho e geometria; sei ser e estar mas não sei dançar, não sei beber e não sei conviver; sei encarar as oportunidades mas não sei aproveitar cada segundo, cada possibilidade por muito remota que seja.
Que sei eu, perguntas-me.
Eu julgo saber de mim e do mundo mas na verdade apenas me conheço e todo o conhecimento que tenho da vida não o sei aplicar sequer para mim.
E se nunca escrevi sobre ti nem sobre mim, amanhã já só me faltará um texto para ti."

Mafalda Martins

sábado, 11 de abril de 2009

Vive o medo



Não deixe que a saudade sufoque, que a rotina acomode, que o medo impeça de tentar. Desconfie do destino e acredite em você. Gaste mais horas realizando que sonhando, fazendo que planejando, vivendo que esperando porque, embora quem quase morre esteja vivo, quem quase vive já morreu. – Luís Fernando Veríssimo

Vives ou existes?


Quando se vive ama-se sem medo! Declaramos e assumimos com garra e vigor tudo o que sentimos, mostramos aos outros quem realmente somos com esperança de triunfar e deixamos que a vida exista em nós.
Quem vive orgulha-se de si e dos seus feitos, pois bons ou maus são eternamente seus; quem vive sofre, chora, perde quebra, magoa-se, desilude, rejeita, sente a falta… E também sorri, confia, é amado e adorado, completa-se, pula de felicidade e lembra sempre que tudo na vida tem consequências que nos levam sempre a algum lado, ao lado que nós escolhemos.

Quem existe apenas pensa e sonha. Sonha com escolhas que tem medo de fazer na realidade e imagina tudo o que gostaria de viver e não vive com medo de tentar.
As tentativas não implicam o sucesso constante e apenas essa possibilidade nos faz recuar com receio de nos expormos ao mundo para sairmos derrotados.

De que vale a vida se só existirmos?

De que vale o dom da fala se nos calamos na hora de proferir um ‘Amo-te’ , ‘Preciso de ti’ , ‘Desculpa’ , ‘Tenho saudades’ com medo de ser em vão e de não ouvirmos o que ansiamos ouvir?
De que vale poder ver e escutar se tudo o que observamos e ouvimos não é nosso nem é fruto das nossas escolhas?
De que vale o medo e a ansiedade, o carinho e a bondade, a dúvida e a tristeza, a alegria e a certeza, a luta e as decisões, as vitorias e as derrotas, se nunca as pudermos sentir como nossas?

Eu já existi e já vivi. E decidi que prefiro viver, ainda que tenha de viver o medo por vezes.

Mas mesmo assim, com medo ou sem ele, que todas as lutas com vitórias ou derrotas sejam minhas, que todas as decisões mais ou menos importantes sejam por mim tomadas, que todos os sorrisos, desgostos, devaneios e todas as gargalhadas, lágrimas e anseios, sejam autênticas e minhas.

Que o amor seja meu e de quem me ame e viva
Que eu viva o medo e não o esconda
Que eu tente e sofra ou seja feliz
Mas nunca me arrependa de não ter tentado
De não ter vivido
Ou de apenas ter existido.

C’

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Devaneio

Qualquer dia dedico-me a outra arte. À pintura, à escultura ou ao teatro, sei lá! É tão difícil expressar o que sinto através de simples palavras escritas em português num cantinho na internet! E mais difícil ainda é garantir que os outros entendam aquilo que escrevo. Se ao menos houvesse um tradutor de pensamentos… Assim podia simplesmente pensar!

Tudo isto acontece porque os nossos pensamentos e sentimentos são todos complicados! Podia agora dizer que estou alegre. Mas não consigo ficar satisfeito com este vazio “alegre”. Sim, o que é que alegre significa? Tudo tem um significado, uma razão, uma importância. A minha alegria não é igual à tua alegria e elas não têm origem nos mesmos acontecimentos. Somos todos diferentes e temos todos sentimentos diferentes. Deveriam, por conseguinte, existir palavras para todos os tipos de sentimentos! Mas isso é impossível.

Assim, acabo aqui a minha intervenção dizendo apenas que estou alegre, seja lá qual for a interpretação que faças deste mero “alegre”.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Memories

Caminhava sozinha, num final de tarde. A praia estava praticamente deserta. Afinal era Outono e o tempo quente e apetecível já lá ia.

Não havia nada tão bom como o tempo. Limava as arestas deixadas no final de cada luta interior, acalmava as angústias e as desilusões, repunha os sentimentos nos devidos lugares e transformava todos os impulsos em sensatez e sabedoria.

O tempo, era como as ondas do mar: trazia e levava, pintava e apagava e tirava e oferecia esperanças, com a mesma facilidade que uma onda deita ao mundo uma pequena concha e a recolhe, depois, para si.
Mas tal como as ondas, o tempo não apaga, apenas disfarça!

E naquele fim de tarde foram desenterradas muitas memórias que se achavam perdidas.

Há quanto tempo não era feliz?
Quanto tempo fazia que as gargalhadas não eram verdadeiras e que as piadas não faziam sentido? Há quanto tempo os sonhos eram relegados para um 'depois' de todo adiável? Há quanto tempo não fazia nada por si própria e se divertia?

As memórias reencontradas eram preciosas e antigas! Eram do tempo em que ela soubera amar sem medo de não ser correspondida. Eram do tempo das palavras e dos olhares brilhantes e sinceros e também do tempo em que se sentava ao final da tarde, acompanhada, a ver o pôr-do-sol.

Agora, eram apenas recordações. Os sonhos permaneciam bem como o amor que se mantinha inconfessável por medo.

E enquanto as ondas iam e vinham, iam e vinham, dia após dia, mês após mês, o tempo ia passando, deixando sempre os sentimentos presos e amedrontados no coração, como uma pérola brilhante e preciosa, demasiado valiosa para ser oferecida pelas ondas à areia e demasiado tímida para se dar a conhecer ao mundo.