Indecisões.
quinta-feira, 6 de novembro de 2014
terça-feira, 24 de abril de 2012
Pintado a preto.
Ontem ao passar por
uma escola de paredes brancas, recebi despropositadamente uma prova de amor
alheio que me fez recuar aos tempos das promessas eternas.
Ainda não sabem, mas um dia hão de desejar, como eu, que o amor seja tão fácil de provar e de se sentir como um ''amo-te'' pintado a preto numa parede, visível aos olhos de todos os mundos mas oferecido por inteiro a um coração só.
"Amo-te
Flávia", escrevera alguém, com spray preto, pintado e descurado, com
pressa e fervor, à imagem do amor que os impulsiona.
Numa reviravolta de
memórias, eu invejei a Flávia. A Flávia que não me conhece, a Flávia que tem um
apaixonado que se arrisca em obras de arte espontâneas para lhe provar um afeto
terno, a Flávia que ainda não sabe mas que um dia há de sentir falta da simplicidade
com que vive.
Menina de sorte, a
Flávia, que me deixa imaginá-la a corar quando chega ao portão da escola para
as aulas da manhã, que me deixa sonhar com os passeios de mãos dadas pelos
jardins que cirandam os limiares de um romance juvenil, que me deixa torcer
pelos sorrisos e pelos olhares secretos entre os rostos dos corredores
apinhados de correrias contrafeitas.
"Para
sempre" acrescentava e terminava assim esse Picasso apaixonado, mal sabendo
ele que estas pequenas promessas hão de ser lembradas um dia, com sorrisos
benevolentes, de quem recorda o passado com compreensão pela inconsciência da
altura.
Quando crescerem hão
de entender que a simplicidade do amor se esconde nas entrelinhas da vida e que
os pares de felicidade vão além dos sorrisos roubados nos furos de almoço. Mas
por agora, enquanto o presente é deles, espero que a Flávia agarre esse pintor
ousado e o deixe por perto, porque é preciso coragem para amar, quase tanta
como a que é precisa para se aventurar em obras de arte apaixonadas na via
pública.
Ainda não sabem, mas um dia hão de desejar, como eu, que o amor seja tão fácil de provar e de se sentir como um ''amo-te'' pintado a preto numa parede, visível aos olhos de todos os mundos mas oferecido por inteiro a um coração só.
quinta-feira, 19 de abril de 2012
Retornada.
Quando se vai, há alturas em que apetece regressar, como quem passeia pelas ruas cinzentas de um dia de Inverno e apressa o passo ao voltar a casa, só para apreciar na plenitude a serenidade confortável do ambiente protegido.
Mas o querer tem tanto que se lhe diga… principalmente quando querer não casa com poder. Para voltar é preciso encontrar um tempo certo, um je ne sais quoi mágico que o mundo nos oferece, generosamente, e que embora não sintamos com consciência, aproveitemos para retornar, instintivamente.
Engana-se quem pensa que ir e voltar é tão somente isso, dois verbos que combinam melodiosamente.
Vai-se e volta-se… E o tanto que perdemos ou ganhámos dita-nos as mudanças com que nos devemos deparar quando pararmos, aqui ou ali, a fim de contar o que nos resta da viagem. Esvaziados os bolsos, depois de se ter visto o que ali ia e de ter sido feito o apuramento, o caminho fica mais leve e com o espaço exato para aquilo que os nossos e outros mundos nos têm para oferecer, se soubermos ver com o olhar certo.
Vai-se e volta-se e não se sabe bem para onde se regressa, porque o mundo gira, dancemos ou não com ele, façamos ou não a música que o acompanha. Querendo ou não as mudanças dão-se, mesmo quando nelas não tivemos uma escolha objetiva, e quando se volta é preciso aceitar o mundo como está, antes de o alterarmos ao nosso bel prazer.
Fui e vim, e hoje volto aqui com esse tal quê de brilho encantado que não me pesa em lado algum e ao invés disso me eleva num sorriso pleno. Podia ter vindo em tantos outros dias mas é hoje que faz sentido, é agora que o meu suspiro me inspira, de novo.
Afinal, estou em casa.
quarta-feira, 16 de junho de 2010
noutro tempo.
São teus todos os suspiros meus, vida minha.
Na verdade tudo o que sou eu, és tu. Porque na verdade, embora livre seja, cativa estou. E cativa sou, de nobre e singela vontade.
O amor que me assomou o peito aprontou-se terno e gentil e sem me dar uma rosa vermelha à socapa, por entre os serviçais, parece que a rosa eu recebi.Estarei doente? Estarei eu a consumir-me numa febre insustentável?
Pois que seja se assim se chamarem os dias brilhantes.
Pois que seja se assim se considerarem os sorrisos trocados com a lua do mundo que é meu e dele. Pois que seja se assim se forem, pelo nome de febre, trocados os olhares de sedução amena, de entrega serena, sem resistência pois que o inimigo não fere.
Será eterno o amor? Dizem-me que as estradas onde me perco, sem volta são. E que sejam e que eu me perca e que eu não volte mais.
Que fuja e me deixe cair ao mundo, porque louca sou. E são loucos só aqueles que amam. E se o preço para o meu amor for, não um dote ou o valor de um punhado deles, que seja a minha sanidade.
Será terno o amor?
Será doce o amor?
Será feliz o amor?
Que seja e que não seja e seja eu com ele tudo o que ele for.
Seja ele e eu com ele o amor dos prados vastos e verdes que se estendem no horizonte. Que os olhemos um dia de mãos dadas.
Que seja eu e ele comigo o pôr-do-sol quente e amistoso que se recebe numa tarde ritmada de Verão.
Que o recebamos de sorrisos trocados.
Que sejamos, ele e eu, eu e ele, os vestígios de tempos antigos, sob um manto de reflexão e misticismo.
Que sejamos nós com ele a paisagem melhor escolhida.
Que seja eu e o amor e ele comigo, o calor de uma aldeia perdida e de uma cidade descoberta. Que seja eu com ele toda a vida e tudo aquilo que a vida traz nas suas sacas de alfazema.
Estarei perdida? Dizem que sim. Que quem ama se perde.
Estarei eu louca? Dizem que sim. Que quem ama é louco.
Estarei eu a ser ingénua? Dizem que sim. Que só os ingénuos se deixam levar nas correntes desse ribeiro selvagem.
E eu sei, tudo isto não poderia passar de uma perdição.
E eu que sou louca e ingénua e tenho em mim todos os sonhos do mundo, prostrados no regaço, abraço todas as loucuras, inocentemente. E abraço-as com força, perdidamente.
É amor?
É. Tudo isto é amor.
sexta-feira, 11 de junho de 2010
O sol à chuva.
É no brilho dos olhos dele que ela, do alto do ser que é, encontra o brilho certo do amanhã. E é depois ao sorrirem num momento sincronizado, que se envolvem, que se prometem, que se confidenciam…
Deu-lhe ela o sol em carta despropositada e ele em resposta mandou o céu regar os jardins do mundo, com pingos de pérolas e saraivas de sonhos. Não havia nem frio nem tempo algum, porque nos instantes todos que têm um do outro, é o tocar de mãos que dita a moda e o sentir.
E ao caminharem, lado a lado, distantes, sabem que é num e noutro que se encontram, como quem se perde e depois desiste e depois ao desistir afinal resiste. É ao viverem o amor num banco de dois, assistindo ao desenrolar da viagem e ao caminhar de todas as ovelhas que ficam na contagem, que os dois, pastores do sol, dos prados e dos céus estrelados, se voltam a apaixonar. Ontem pelo toque, hoje pelo olhar.
E enquanto os poetas escrevem as odes, fazem os amantes as historias delas, vivendo-as para alguém as escrever, sonhando-as para alguém as ler, sentindo-as para nelas ser não o único, mas o maior amor do mundo.
Sabem que amam. Sabem o que é o amor deles. Sabem o que são e o que querem ser e não faltaram à lição sobre a como olhar a dificuldade do amor em 365 dias por ano. Sabem-no e desejam, ainda que pastores, navegadores, exploradores ou conquistadores sejam, testar e provar outra teoria.
Uma teoria em que quando o mundo gira e o par respira num sopro de tempo a tempo, o mundo gira com mais força, em contra-tempo, alternando bateres de coração com pulsares da terra.
Uma teoria em que se comprove cada sentimento de uma caixinha de música presente nos corações próprios de quem ama, desde o azul da ternura ao cinzento do ciúme, passando pelo encarnado do bem-querer e pousando um leve e terno beijo no branco divino da plenitude.
Uma teoria que mostre a verdade dos sentimentos que se aglomeram em torno do sol. Ele que brilha. Não brilha mais do que senão por eles, por eles que se apaixonam. E é por eles também que chora o céu, num misto de inveja e sedução, de ciúme e ilusão.
Uma teoria que deixe claro que são estes amores apaixonados que movem o mundo, de olhos nos olhos. Esquece-se o céu e o sol das leis dos sábios de ontem e entregam-se à mercê do amor. Esse que as montanhas não move nem as estrelas faz cair, mas que faz chorar o céu e ao sol dá motivos para ser, viver e sentir.
É a teoria que comprova a letras grandes e distintas que o amor se ergue difícil no espaço. Leva nele o ser, o beijo e o abraço.
É a teoria que exige o respeito pela ideia de um sol derivado.
Rodopia pelo amor, pelo sério e pelo complicado.
E é nessa teoria em que o céu chove e o sol se apanha desprevenido que se sabe poder provar, que o amor é o acontecimento.
É o sol à chuva num momento.
O amor é isso. É o sol à chuva. Que ao mundo as cores da perfeição. Porque o sol à chuva, resulta nele. No arco-íris da entrega, do sonho, da vida, do mundo e do coração.
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