sexta-feira, 17 de abril de 2009

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"Nunca escrevi sobre ti nem sobre mim; de ti, porque não sei quem és e de mim porque me conheço bem demais para o fazer.
Sei tanto de mim como do resto... sei tanto de mim como um músico sabe de escalas, sei tanto de mim como um matemático sabe de contas e como um apaixonado sabe de sonhos.
Porque não falo de mim? Porque se o fizer tornar-me-ei vulnerável ao mundo, ficarei à mercê de quem não conheço e irei trair todo o conhecimento que aprofundei sobre mim mesma.

Mas porque não correr um risco? Porque não fazer por uma vez o que não faço nunca?
Nunca escrevo na 1ª pessoa porque... tenho medo que as pessoas me conheçam melhor do que eu quero mostar.
Nunca arrisco muito a tomada de decisões porque... tenho medo de errar e fazer a escolha menos correcta.
Não realizo e passo muito tempo a sonhar porque... os sonhos têm finais que eu comando e são sempre finais felizes.
Nunca admito que amo quando sei que o sinto porque... não me considero dotada o suficiente para ouvir um "eu também!".

Sim, sou perfeccionista, sonhadora e insegura.
Nao gosto que as coisas que planeei falhem e me fujam da alçada; sonho com tudo o que realmente quero mas não realizo porque tenho medo de não ser perfeita, ou melhor, porque tenho medo de não ser nem fazer tudo o que já idealizei; a opinião dos outros é penosamente importante para mim e recorro facilmente à aprovação de várias pessoas pois não sei até que ponto a minha estará correcta.

Dizem que sou sensata, que sou inteligente, que sei ser e estar, que sei encarar as oportunidades... Mas não me conhecem e a culpa não é deles.
Sou sensata com os outros mas não sigo aquilo que aconselho; sou inteligente mas não percebo de física nem de química ou desenho e geometria; sei ser e estar mas não sei dançar, não sei beber e não sei conviver; sei encarar as oportunidades mas não sei aproveitar cada segundo, cada possibilidade por muito remota que seja.
Que sei eu, perguntas-me.
Eu julgo saber de mim e do mundo mas na verdade apenas me conheço e todo o conhecimento que tenho da vida não o sei aplicar sequer para mim.
E se nunca escrevi sobre ti nem sobre mim, amanhã já só me faltará um texto para ti."

Mafalda Martins

1 comentário:

Andre Vidal disse...

Tá muito fixe o texto... Descreve mesmo bem a forma como a Mafalda se sente. Talvez precise de arriscar mais, de não se preocupar tanto com o que gira à sua volta, de querer mais para ela e não tudo para os outros. Afinal só ela pode viver a sua própria vida. Diz-lhe que não a desperdiçe. Só se vive uma vez!

Beijinho*